O Que é Um Vício e Como Reconhecê-lo.
Maria Eduarda Pedroso
10 de mar. de 2022 - Leitura de
7 min
Para se livrar de um vício, é necessário primeiro reconhecer que ele existe. Parece óbvio, mas em muitos casos identificar que um hábito se tornou irresistível e está afetando a qualidade de vida pode ser tão ou mais complexo do que se livrar dele.
A dependência é uma doença crônica. Mas como é causada por fatores genéticos, biológicos, psicológicos e ambientais, identificá-la é sempre um desafio. Ela afeta as funções de recompensa, motivação e memória do cérebro, prejudicando o autoconhecimento e o autocuidado.
No entanto, transtornos aditivos e aqueles relacionados a substâncias têm uma característica em comum: eles se tornam mais importantes para a vida da pessoa do que qualquer outra atividade. Seus impactos são físicos, psicológicos e emocionais.
Normalmente, para alguém que observa este processo em outra pessoa, identificar um vício é mais fácil. Ter uma uma forte rede de suporte é essencial para todos, mas para quem precisa de ajuda para vencer uma dependência é ainda mais importante.
Ao longo desse artigo descrevemos alguns meios de reconhecer um vício, suas consequências e tratamentos:
- Significado e tipos
- Causas
- Primeiros Sinais
- Efeitos no corpo
- Cronicidade
- Consequências
- Tratamentos
- Como buscar ajuda
O que significa vício e seus tipos
A palavra vício é associada ao abuso de substâncias e dependências comportamentais, como jogo e celular. De modo geral, toda atividade que uma pessoa é incapaz de se abster consistentemente, seja um comportamento ou substância, pode ser considerada um transtorno aditivo.
Algumas das substâncias que provocam essa doença crônica são drogas lícitas, como álcool e nicotina, ou ilícitas, como maconha e cocaína. Além disso, há também o vício por medicamentos, caracterizado pelo uso descontrolado de remédios sem indicação médica.
O vício comportamental pode incluir jogos de azar, sexo, celular, internet e redes sociais. A dependência emocional também é classificada desta forma.
Mas o que causa um vício?
O nome que se dá para o estudo das causas de doenças é etiologia. No caso de transtornos aditivos, os especialistas buscam respostas em múltiplos aspectos da vida da pessoa, sejam questões genéticas, biológicas, psicológicas ou ambientais, como estilo de vida.
O vício, portanto, não é só uma escolha. Suas causas têm múltiplos fatores. Assim como no diagnóstico de diabetes tipo 2 e outras doenças crônicas, não é possível indicar uma única origem para esta condição.
Em termos psicológicos, a dependência pode ser vista como o anseio de suprir uma necessidade que não foi completamente satisfeita. A adição serve como uma forma de alívio e satisfação.
O vício pode ser uma resposta à dor emocional. Isso não quer dizer que todas as pessoas do mundo que já se frustraram tornaram-se dependentes. A maioria dos que trilham esse caminho, no entanto, fazem isso para amenizar um trauma.
Identificando os primeiros sinais de um vício

Nos estágios iniciais, o indivíduo pode não apresentar sinais significativos e preocupantes. Mas isso pode mudar em pouco tempo.
Grande parte das pessoas apresentam componente genético ou uma predisposição hereditária, mas a dependência está intimamente ligada ao comportamento. Confira alguns sinais que podem indicar o começo de algo grave:
- Incapacidade de se abster constantemente de algo;
- Aumento da ansiedade e dor emocional;
- Resposta emocional disfuncional;
- Desinteresse em obter ajuda;
- Dificuldade em expressar sentimentos.
Quando o transtorno aditivo é ao mesmo tempo um hábito social comum, como consumir bebidas alcoólicas e tabaco, torna-se ainda mais difícil identificar os primeiros sinais de compulsão. O que no início pode parecer um ato ocasional para controlar o estresse, por exemplo, pode evoluir rapidamente para a dependência física e psicológica.
Uma pessoa com a mente saudável geralmente reconhece um comportamento propenso ao vício e consegue se livrar dele antes de precisar de ajuda externa. Mas esse não é o caso de indivíduos dependentes: admitir que o problema existe se torna quase impossível. O dependente químico tem a tendência de encontrar justificativas para continuar com os mesmos comportamentos que o prejudicam.
Esse comportamento de negação do vício dificulta o processo de tratamento. O primeiro passo para obter ajuda é o reconhecimento dos sinais físicos, mentais e emocionais.
Efeitos do vício no corpo
O vício afeta a anatomia do cérebro em muitos níveis. No funcionamento químico, na sinalização de uma célula à outra, e até mesmo nas sinapses associadas ao aprendizado.
Após o uso de substâncias químicas, como a nicotina e o álcool, há mudanças no cérebro e na corrente sanguínea. Essas alterações causam a perda de controle dos impulsos ou o desejo por uma nova substância.
O cérebro do dependente anseia pela sensação gerada pela substância ou hábito. Isso porque o uso ou evento estimulam o sistema de recompensa do cérebro. Em resposta a esses estímulos, muitos usuários se tornam ainda mais viciados, necessitando de doses cada vez maiores para atingirem alguma satisfação.
As drogas interagem com o sistema límbico para liberar emoções de bem-estar, afetando o corpo e a mente. Os adictos continuam no vício para sustentar a sensação de satisfação que o cérebro libera, criando um ciclo de uso apenas para se sentirem normais.
A frequência do vício
Que todos os vícios têm natureza recorrente nós já sabemos. O que não dá para se afirmar é que todos são iguais. Ou únicos.
Em 2021, especialistas canadenses publicaram um estudo de 5 anos sobre a cronicidade — ou a constância de um vício. Cerca de 1000 voluntários com algum tipo de comportamento obsessivo participaram. Pessoas lutando contra abuso de substâncias, vício em jogos, sexo e compras. Muitos dos participantes ainda possuíam mais que um transtorno aditivo.
A pesquisa concluiu que diferentes transtornos aditivos têm cronicidades distintas. Além disso, vícios múltiplos tem uma maior cronicidade em comparação a um único.
O uso de drogas e a prática de jogos de azar são doenças crônicas com nível alto de assiduidade e constância. Mesmo que para alguns indivíduos pode ser mais fácil se engajar em um tratamento, a tendência é que estes transtornos aditivos sejam mais crônicos de forma geral.
Em contrapartida, comportamentos excessivos, como compras compulsivas, são mais passageiros para a maioria das pessoas. Sua intensidade varia de acordo com as fases da vida. Porém, isso não torna o tratamento menos importante. Pode-se argumentar até o contrário: quanto maior o aspecto de normalidade entre uma crise e outra, maiores e mais graves podem parecer as consequências do transtorno quando ele ocorre.
Consequências a longo prazo
No início, uma dependência não tem consequências especialmente claras. Nos estágios intermediários e avançados, no entanto, os efeitos podem ser muito negativos.
No âmbito psicológico, já vimos que prejudica a capacidade cognitiva da pessoa. Socialmente, tende a ser uma tragédia inclusive para familiares e amigos. Fisicamente, pode causar até mesmo a morte.
Quem tem transtornos aditivos crônicos demora a realizar uma análise que para todas as outras pessoas é até automática: comparar os riscos do seu hábito com seus benefícios e decidir por mantê-lo ou largá-lo.
Uma pessoa sem propensão à dependência logo percebe que os riscos de usar uma substância tóxica frequentemente são muito maiores que os seus benefícios. Um indivíduo viciado, no entanto, está doente e tem menor capacidade de julgamento. Com a função de recompensa do cérebro prejudicada, a decisão sobre manter o hábito aparenta ser sempre melhor. O que é um erro grave.
As consequências estão ligadas a doenças emocionais: depressão, ansiedade, insônia e compulsão, por exemplo. Mas também se manifestam em todo o corpo como dores musculares, cansaço e perda de apetite. Ao logo do tempo, cada um destes sintomas fica gradativamente mais acentuado.
No longo prazo, todo sistema neural é afetado, fazendo com que a pessoa não cumpra quaisquer dos seus outros compromissos profissionais e pessoais. Perder empregos e relações afetivas é uma ocorrência comum.
Tratamentos para o vício

O vício não tem cura, pois é um problema crônico. Mas como qualquer doença deste tipo pode e deve ser tratado.
Qualquer pessoa que um dia foi dependente pode voltar a ter uma vida mais saudável. Em geral, esse processo de desintoxicação passa por aprender a controlar desejos e reprogramar o sistema de responsabilidades.
O primeiro passo para a recuperação é o reconhecimento do problema. Uma vez que isso acontece, muitos tratamentos estão disponíveis. Para a maioria das pessoas, esse cuidado tem que ser feito para o resto da vida.
O tratamento de um vício não é padronizado, a melhor opção é um plano terapêutico personalizado de acordo com as necessidades e disposição do adicto.
As opções de tratamento incluem o acompanhamento biopsicossocial, feito por uma equipe de saúde integrada. Em geral, é composta por psiquiatra, psicólogo e assistente social. Eles avaliam os fatores biológicos, psicológicos e sociais para traçar o tipo de cuidado mais adequado ao perfil do paciente e seu vício.
A combinação de abordagens, como terapia e medicação é historicamente usada com bom grau de sucesso. Para os sintomas físicos, há atendimento psiquiátrico e de um clínico geral.
1. Desintoxicação
A desintoxicação acompanhada por um médico consiste em livrar o corpo do adicto das substâncias em um ambiente seguro. Geralmente é usada em combinação com outras terapias.
2. Terapia Cognitiva Comportamental (TCC)
Usada para diferentes tipos de dependência, a TCC ajuda não só a reconhecer os padrões comportamentais, como também a identificar gatilhos que levam ao consumo ou hábito e desenvolver forças para enfrentá-los
3. Gerência de contingência
O Gerenciamento de Contingências é usado para uma grande variedade de vícios também. Esse tipo de terapia reforça o comportamento resiliente e positivo, mantendo a sobriedade e proporcionando recompensas tangíveis. Essa alternativa tem sido bastante usada em casos de recaídas, de acordo com o Instituto Nacional de Abuso de Drogas, nos Estados Unidos.
4. Os 12 passos
O programa dos 12 passos é muito conhecido e pode ser usado para tratar o abuso de álcool e outras substâncias.
É caracterizado por ser uma terapia em grupo. Nela, os participantes falam sobre o reconhecimento do vício e suas consequências. Este tipo de tratamento inicia com a aceitação, depois arrependimento e por fim a troca de experiência com seus colegas. Programas como Alcoólicos Anônimos e Narcóticos Anônimos usam essa técnica para apoio mútuo.
5. Medicamentos
O uso de medicamentos, sempre com acompanhamento médico, pode ter um papel importante quando feito junto com terapias comportamentais. A medicação correta pode reduzir os desejos, melhorar o humor e diminuir comportamentos repetitivos.
Precisa de ajuda? Não Hesite.
Muitos hábitos proporcionam prazeres genuínos ao corpo e à mente. Todos eles, quando realizados em excesso, podem evoluir para um vício. Enquanto sentir prazer a partir de uma substância ou comportamento é importante para a qualidade de vida, sem o devido equilíbrio pode se tornar uma dependência crônica.
Ao primeiro sinal de descontrole, é essencial ter alguém a quem se apoiar e pedir ajuda. O quanto antes for identificado um transtorno aditivo, maiores serão as chances de recuperação. Por consequência, ter uma rede próxima de familiares, amigos e profissionais de saúde é um fator decisivo para evitar a recidiva de um vício.
Portanto, se você ou alguém com quem você se importa vêm demonstrando sinais de transtornos aditivos ou lutando contra um vício — não hesite em pedir ajuda. Não há necessidade de lutar esta batalha sozinho. Converse com um profissional da saúde, existem tratamentos que podem auxiliar na superação e na retomada do bem-estar físico e emocional com qualidade de vida.