Longevidade

Saúde mental do idoso após a pandemia: reconhecimento e superação.

Saúde mental do idoso após a pandemia: reconhecimento e superação.

A pandemia de covid-19 alterou a maneira como a sociedade se organiza e convive. Essas alterações repentinas trouxeram consequências ao nosso bem-estar psicológico. Por razões que vamos discutir mais adiante, a terceira idade normalmente reage melhor ao estresse comparado à população mais jovem. A magnitude das mudanças dos últimos anos e o tempo de isolamento tornaram necessário, no entanto, um olhar mais atento à saúde mental do idoso.

É justamente agora — quando começamos a retornar com mais confiança a muitos dos hábitos e interações comuns antes da pandemia — que começamos a enxergar com mais clareza quais os efeitos persistentes desse período de alto estresse na saúde do nosso corpo e mente.

Estudos realizados entre 2020 e 2021 em vários países já indicavam um aumento nas taxas de ansiedade e depressão em adultos acima de 65 anos. Talvez por diferenças na forma como respondem ao estresse, sua personalidade, status social ou estabilidade financeira, o crescimento desses transtornos entre os idosos foi menor do que entre os jovens. Mas, ainda assim, um sinal vermelho surgiu no período da pandemia.

Depressão em idosos: a solidão do isolamento.

O coronavírus ativou um novo modo de vida, ninguém estava preparado para uma pandemia e o medo da contaminação afetou a saúde mental de pessoas de todas as idades. O isolamento social e a solidão foram consequências prejudiciais do distanciamento físico, principalmente para a população idosa.

A solidão não está apenas associada à ansiedade, raiva e instabilidade emocional, mas também ativa o sistema nervoso simpático, levando à hipertensão, inflamação e níveis elevados de hormônio do estresse.

O isolamento social está associado à diminuição da qualidade de vida e ao aumento dos riscos de morte prematura, acidente vascular cerebral e demência na população idosa. Mesmo antes da pandemia, os idosos já corriam maior risco de isolamento social e solidão do que as faixas etárias mais jovens.

Uma pesquisa divulgada pela agência de saúde norte-americana Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) de julho de 2020 mostrou que 46% dos adultos com 65 anos ou mais achavam que sua saúde mental era influenciada negativamente por preocupações relacionadas ao coronavírus. Taxas semelhantes de depressão e ansiedade (37,1%) foram relatadas em pacientes com mais de 60 anos durante a pandemia.

Em agosto de 2020, um em cada quatro (24%) idosos relatou ansiedade ou depressão, o que aumentou significativamente em relação a uma pesquisa pré-pandemia realizada dois anos antes.

Um grupo de pesquisas da Itália investigou as maiores decepções emocionais do confinamento para 126 idosos italianos com declínio cognitivo e descobriu que eram a incapacidade de se reunir com a família (41,3%), de sair de casa (24,6%), de exercitar-se normalmente (23,8%), de receber ajuda de trabalhadores domésticos ( 14,3%) e, não menos importante, de frequentar consultas médicas (5,6%).

Apesar das taxas de depressão em idosos serem mais baixas do que em jovens, as consequências da depressão nesse grupo podem ser ainda mais devastadoras. Idosos com depressão são mais propensos a ter comprometimento funcional em comparação aos não deprimidos e têm menor recuperação de distúrbios médicos, como a covid-19.

No gráfico acima vemos que o maior número de pessoas hospitalizadas por Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) em 2020 no Brasil foram idosos entre 60 e 69 anos. Cerca de 92% dos óbitos por SRAG estão relacionados a diagnósticos de covid-19.

Os fatores que influenciaram a saúde mental do idoso na pandemia.

Casal de idosos se abraça: evitar solidão é fator importante para manter qualidade na saude mental.

Demografia

O sexo do indivíduo é um dos fatores que teve influência no desenvolvimento de depressão e ansiedade. Em agosto de 2020, no auge da pandemia, 28% das mulheres idosas relataram se sentirem ansiosas ou deprimidas. Entre os homens, a taxa foi de 20%. Ideações suicidas, no entanto, são mais comuns entre eles do que entre elas.

Status socioeconômico

Incertezas sobre o futuro e a capacidade de suprir necessidades básicas são uma fonte comum de ansiedade. As consequências econômicas da pandemia foram sentidas em todos os níveis: indivíduos, comunidades e países. Isso intensificou ainda mais os efeitos dessa reação.

Quanto menor a segurança socioeconômica, maior a taxa de ansiedade e depressão. Enquanto na média pode-se dizer que na velhice estamos melhor estruturados financeiramente do que na juventude, quando olhamos apenas a população acima de 65 anos encontramos grandes disparidades: aqueles que têm menos recursos foram mais afetados por transtornos mentais causados pelo período de incertezas provocadas pela covid-19.

Situação de vida

O ambiente de vida durante a pandemia afeta o risco de ansiedade ou depressão.

Relatos de ansiedade e depressão foram ligeiramente maiores em idosos que moravam sozinhos em comparação com aqueles que moravam com pelo menos uma outra pessoa.

Por outro lado, cuidadores não-profissionais — pessoas que em uma família são responsáveis por ajudar e acolher familiares com menor autonomia — foram severamente afetados pela ansiedade e outros transtornos à saúde mental. A triste constatação é que quando se trata do nosso bem-estar psicológico, não houve ganhadores nesses últimos dois anos. Apenas uns demonstraram menos efeitos do que outros.

Condições de saúde mental pré-existentes

Uma das associações mais marcantes entre o desenvolvimento de transtornos mentais entre idosos durante a pandemia é ter uma condição psiquiátrica pré-existente.

Não surpreendentemente, os pacientes com ansiedade básica (tipo de ansiedade que não precisa de nenhum estímulo para ser sentida, mediando todos os relacionamentos com outras pessoas) ou distúrbios do sono demonstraram maior propensão a sofrer depressão durante a pandemia.

A Crise dos 60 anos

Homem de meia idade pensativo durante trabalho remoto.

Embora uma crise de meia-idade não seja um diagnóstico médico oficial, é uma fase comum entre as pessoas com mais de 60 anos. Ela pode causar uma reviravolta emocional em suas vidas à medida que iniciam um processo de aceitar o envelhecimento. A pandemia fez com que este assunto viesse à tona.

A crise da meia-idade é mais um fenômeno social do que uma doença mental específica. É um termo que se refere à insatisfação, ansiedade e sentimentos de depressão ou remorso que muitos começam a sentir quando passam da primeira parte de sua vida adulta para a meia-idade. Homens parecem ser mais propensos aos seus efeitos do que mulheres.

Durante esse período, é comum olhar para as coisas que foram planejadas e ver que elas não se concretizaram, ou outras pessoas terem sucesso de maneiras que podem trazer o sentimento de inadequação e até ressentimento.

A pandemia trouxe esse sentimento de incapacidade, visto que muitos idosos foram prejudicados não intencionalmente com o distanciamento social, obtendo um tempo maior para pensar nas suas frustrações, com consequente declínio na saúde mental.

Uma crise dos 60 anos pode se tornar depressão?

Uma crise dos 60 anos pode se transformar em depressão grave. Veja alguns sinais que podem ser usados para reconhecê-la:

  • Mudanças nos hábitos alimentares
  • Mudanças nos hábitos de sono
  • Perda de interesse em atividades que antes eram agradáveis
  • Fadiga inexplicável
  • Ansiedade
  • Sentimento de solidão
  • Pensamentos de suicídio

Superação e envelhecimento ativo

Lazer, diversão e companhia são essenciais para vencermos períodos de ansiedade e depressão.

Envelhecimento é para todo mundo. Porém o percurso pode e deve ser leve e com muita saúde. O envelhecimento ativo é o processo de otimizar as oportunidades de saúde, participação e segurança para melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas envelhecem. Independente do contexto social ou de saúde pública.

Atingir a longevidade com qualidade e autonomia para desfrutar melhor a vida após os 60 anos é um objetivo nobre e atemporal — que não depende do que aconteceu no passado e como está o presente. Começar já, mesmo durante a velhice, é preferível a nunca fazê-lo. Mas quanto antes, melhor.

Envelhecer não é uma doença: é um fator de risco. Devemos estar sempre atentos e não negligenciar qualquer sinal que o corpo e a mente nos dão, principalmente no caso dos idosos. Com o passar dos anos nossa capacidade de combater doenças com força total vai diminuindo. É o ciclo da vida se apresentando. Por isso, atenção redobrada e planejamento de saúde são essenciais.

Para garantir uma boa recuperação e superação após um período traumático é importante promover o bem-estar da saúde mental e reduzir o estresse. Enquanto indivíduos, temos responsabilidade pessoal quanto ao nosso estado de saúde. Ao mesmo tempo, podemos e até devemos trabalhar em comunidade para que ações de promoção da qualidade de vida e da longevidade estejam ao alcance de todos: idosos ou jovens, ricos ou pobres, homens ou mulheres.

Quem sofreu com ansiedade e depressão durante estes últimos anos, tem ao seu alcance melhores hábitos que sempre foram e seguem sendo importantes para a nossa saúde — mental e física:

  • Investir em um sono adequado em quantidade e qualidade.
  • Observar uma dieta balanceada.
  • Praticar exercícios apropriados para a idade e saudáveis para o corpo.
  • Exercitar a mente com leitura e troca de experiências entre familiares e amigos.
  • Procurar ajuda especializada sempre que o peso mental pareça maior do que sua capacidade de carregá-lo.

Acostume-se à ideia de manter o seu corpo e mente ativos o quanto antes e viva os melhores momentos, investindo em seu bem-estar e no de quem você ama.

Lições para o futuro de todos nós

Em paralelo, a sociedade em geral também precisa melhorar sua capacidade de analisar riscos e benefícios. É um grande desafio. Durante a pandemia de covid-19 o julgamento sobre a eficácia de lockdowns e seus potenciais efeitos negativos na saúde mental, física e financeira da população foram negligenciados, nem sempre por razões puramente epidemiológicas, relacionadas à saúde pública.

Um análise de risco e benefício deve ser capaz de medir as consequências de um intervenção médica em diferentes esferas da vida, usando para isso a melhor ferramenta que existe para a busca da verdade: o método científico. Ele pode ter seus problemas, mas não há método concorrente à altura para o mesmo objetivo. Nem político, nem moral, nem religioso. A medicina deve ser puramente baseada em evidência.

A principal vantagem da ciência, quando feita corretamente, reside no fato de que pode atualizar o conhecimento ao logo do tempo. Uma sociedade capaz de analisar os riscos e benefícios deve ser ágil em corrigir o percurso, evitando que decisões anteriores — mesmo que tomadas com boas intenções — acabem resultando no aumento de riscos que eram então ignorados. Principalmente se estes forem até maiores do que os riscos que motivaram originalmente a decisão.

Enquanto a solidão é um fator de risco reconhecido para morte prematura, os idosos também foram as maiores vítimas do coronavírus. Mas agora os dados mostram que o isolamento total da população teve eficácia menor do que o esperado no combate à covid-19. Ao mesmo tempo, continua verdade que a solidão na vida adulta aumenta a mortalidade de pessoas mais velhas.

Institucionalmente, o Norden Hospital e Plano de Saúde acredita que investir na educação da comunidade sobre as decisões que podem afetar a saúde de indivíduos e da sociedade como um todo é a melhor forma de criar um país mais saudável, onde todos participam ativamente na promoção da longevidade com qualidade de vida de si mesmos e do próximo.

A pandemia trouxe tristeza e tragédia para milhares de famílias. Nunca vamos esquecer disso. O que fica agora são muitas lições importantes para o futuro. Entre elas a de que nossa saúde mental precisa de cuidados constantes e deve estar sempre entre as nossas prioridades quando tomamos decisões que podem afetar repentinamente o nosso modo de vida.

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